- O médico acha que é no intestino, agora.
- Como assim, acha?
- Mandou fazer uns exames, mas tem todos os sintomas. Me disseram que a radioterapia ali perto... sabe? - faz um gesto indicando - pode acontecer...
- Mano, o vô vai morrer.
- Vai.
Foi ele que me disse mas, desnorteantemente, ao mesmo tempo me ocorreu que meu irmão ainda não tinha entendido. "Vai", ele concordou, com o mesmo constrangido ar grave meu e de todo mundo ao falar nessas coisas: morrer.
"Ele só tem 19 anos", pensei, e antes de completar o pensamento me dei conta,"...de vida". Mais uma vez diante de uma situação como essa, estou perplexo ante o óbvio que soa até ridículo: não temos experiência de morte. Aliás, morte parece mesmo algo como isto, anti-experiência. Em relação a ela tenho os olhos arregalados e as pupilas monstruosamente dilatadas de quem quer ver no escuro. Não vejo, como todos ou, ninguém. Também não vejo e não apreendo o que mal me pode ser dito. Ninguém alcança. Meu irmão, eu, ou meu avô - que ainda não morremos - nenhum de nós têm sequer um segundo de morte. Mas entre nós todos, continuamos sentindo-a mover-se furiosamente, suavemente...
4 comentários:
Sim... afeto.
Estou aprendendo, amargamente, que as palavras que saem das nossas bocas, sejam poeirentas-aladas ou limpíssimas, tocam o Outro com imensa violência...
[conversamos melhor amanhã... até Dé.]
ah, obrigado.
eu sempre leio o teu blog pelo meu leitor de rss. só não comentei esse post porque achei tão 'sério'.
queremos mais!
"Mais uma vez diante de uma situação como essa, estou perplexo ante o óbvio que soa até ridículo: não temos experiência de morte. Aliás, morte parece mesmo algo como isto, anti-experiência. "
Muito bom, André. A morte nos parece tenebrosa quando ainda não a alcançamos por inteiro, mesmo que não sejamos nós a "boa" da vez. Mas quando o individuo (eu, por exemplo)passa por situações que nos fazem o "favor" em colocar a morte como uma situação de perplexidade e inexperiência, aprendemos muito e, com isso, enxergamos o quão nula é a morte. Como já dizia Borges: "[...]a morte do corpo é totalmente insignificante e que morrer deve ser o fato mais nulo que pode acontecer a um homem."
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